EM MEMÓRIA DOS MINEIROS DO PEJÃO
LIVRO “ CARVÃO DE AÇO “ DE ADRIANO MIRANDA APRESENTADO EM
GERMUNDE NO FERIADO DO 1º DE MAIO
Gonçalo Rocha quer memória mineira enquadrada na
estratégia de promoção turística
No feriado dedicado ao Dia do Trabalhador, o
fotojornalista Adriano Miranda apresentou o livro “
Carvão de Aço” que se apresenta como um “memorial” de fotografias sobre as
Minas do Pejão, captadas há 25 anos atrás e que foi agora lançado, em cerimónia
bastante participada e realizada nas instalações do Poço de Germunde (
PG1 ) em Pedorido, Castelo de Paiva, numa iniciativa que teve o apoio da Câmara
Municipal de Castelo de Paiva e da União de Freguesias da
Raiva, Pedorido e Paraíso
Em forma de livro, esta foi uma merecida homenagem da
autarquia aos antigosMineiros do Pejão, onde a iniciativa da edilidade
paivense se traduziu no regresso do fotojornalista do jornal Público às
Minas do Pejão, numa bonita cerimónia abrilhantada pelo Ensemble de Flauta da Academia
de Musica de Castelo de Paiva e repleta de emoção e palmas, mais
evidenciadas quando o autor fez questão de referir, na sua intervenção, que
doava os direitos de autor de todas aquelas imagens, captadas na escuridão da
mina, para o município, “ para que talvez um dia, o Complexo Mineiro deixe de
ser apenas uma memória e possa ser um espaço de gente a fervilhar de vida e de
trabalho “.
A convite da Câmara Municipal de Castelo de
Paiva, e contando com o apoio dos fundos europeus do Portugal
2020, através da intervenção da ADRIMAG, o fotojornalista do jornal
Público aproveitou a oportunidade para revelar um trabalho que
realizou ao longo de três anos, enquanto estudava fotografia no Centro de Arte
e Comunicação Visual, em Lisboa.
O autor da obra confessa agora que fez amigos nas Minas
do Pejão, um local que se tornou uma espécie de vício durante quase três
anos, o período que demorou a realizar o trabalho fotográfico, deslocando-se de
Lisboa para Castelo de Paiva, para descer na “jaula” (elevador), a 410 metros
de profundidade e fotografar os mineiros, homens “fortes” e “franzinos”,
“novos” e “velhos”, e que “tinham um orgulho de aço” em ter a profissão de
mineiro.
O percurso de um turno de trabalho dos mineiros das 8h
às 15h e que termina na hora do banho é a narrativa escolhida para o “Carvão
de Aço”, uma obra que, conforme refere o autor, reúne 140 imagens
fotografadas a preto e branco na época dos negativos e da câmara escura, que
foram captadas a 400 metros de profundidade, apenas com as luzes das lanternas
dos trabalhadores.
“ Não é um livro normal. O livro todo preto, desde a capa à
contracapa. É como se fosse uma peça de carvão. Não há miolo, nem margens
brancas. O branco que existe é apenas das fotografias. Tudo preto para se
sentir a intensidade da mina”, descreveu o fotojornalista na apresentação que
fez, nesta sua passagem pelo território paivense, onde por vezes emocionado,
soube relatar vivências evidenciadas na mina, numa intervenção estruturadas em
temas como a utopia, dignidade, trabalho e futuro, mostrando –se orgulhoso por
pelo facto do lançamento do “Carvão de Aço” ter potenciado a vinda de tantos
amigos ao Couto Mineiro do Pejão.
Perante uma sala repleta, o presidente da Câmara Municipal, Gonçalo
Rochaevidenciou que esta cerimónia é uma forma de recuar às origens e
enalteceu o trabalho de Adriano Miranda enquanto profissional e ser humano,
lembrando a importância da fotografia não só na preservação da memória de todos
aqueles que deram o sangue e suor nas profundezas da nossa terra, mas como
também como registo, daquilo que de bom se pode fazer pelo futuro do concelho.
Relembrando o contacto inicial com o autor, no âmbito
de um trabalho sobre o potencial turístico do concelho, o autarca classifica
este livro como uma obra fantástica, “ plenamente inserido na estratégia de
promoção e salvaguarda do património histórico e cultural, representando mais
do que um registo, um testemunho do valioso património que as minas significam
para Castelo de Paiva e em particular para a região do Couto Mineiro do Pejão
“, não deixando de recordar a dinâmica económica que outrora as minas geravam,
os valorosos mineiros “ duros como o aço “ que desciam às profundezas para
ganhar o sustento de famílias inteiras, e a Banda dos Mineiros do Pejão como
referência cultural da memória viva da epopeia mineira apagada há 23 anos.
Gonçalo Rocha sublinhou, ainda, a importância
de olhar para estes espaços de maneira diferente, procurando valorizar estas
memórias da exploração carbonífera, enquadrá-las na estratégia de promoção
turística que se deseja para o concelho, potenciando atractividade, o interesse
de visitantes com a realidade mineira,
O jornalista Miguel Carvalho, da revista Visão,
também destacou a obra de Adriano Miranda que “soube captar seres humanos de
tamanho gigante “, onde, “ no claro/ escuro destas imagens moram vivências
sofridas, suadas, existências enraizadas no trabalho, homens que foram
toupeiras da nossa claridade em quotidianos de escuridão “ num território que,
evidencia o jornalista, “ pelo seu passado, deve inspirar grande respeito e
veneração, porque apesar da escuridão e das poeiras que se entranharam na
existência das gerações, aqui se ergueu, a preto e branco, um monumento à
decência dos homens “.
Neste livro, fruto de três anos de trabalho e de um olhar,
segundo o autor, ainda virgem e não contaminado pelas rotinas da profissão, Miguel
Carvalho refere que, “ os mais velhos recordarão a face negra das
chagas, das maleitas, mas também expressões que são retrato de tempos generosos
e encontrarão o orgulho da história que construíram sem desfalecimentos e de
cujo exemplo todos somos devedores “ e quanto aos mais novos, “ irão descobrir
os rostos que ergueram na mina o seu altar todos os dias e a prova do que valem
os homens que, não querendo ser medidos pelo seu tamanho e condição, buscam a
comunhão entre iguais “.
Para o jornalista, que enalteceu esta iniciativa da
autarquia de Castelo de Paiva, muitos encontrarão neste livro de Adriano
Miranda, o homem e a identidade do profissional da época dos negativos
e da câmara escura que sabe que o valor da memória e da fraternidade não se
trafica nem em tempo da ditadura digital, sendo que, o fotojornalista é também
alguém que sabe cartografar os sítios sagrados e honrados os homens se superam,
apesar das circunstâncias.
Guardados na gaveta há 25 anos, os "milhares de
negativos" de Adriano Mirandaforam digitalizados e, durante a
selecção das imagens para o livro, o fotógrafo referiu que encontrou “muitos
tesouros” e fotografias inéditas, como o de uma jovem mulher mineira,
publicadas nesta obra agora editada.
Este livro “ Carvão de Aço “ que tem prefácio do fotógrafo e
docente José Soudo, e o testemunho do edil Gonçalo Rocha e
do Engº Rui Paiva, que foi à época, director de exploração da Empresa
Carbonífera do Douro, apresenta um grafismo do atelier portuense
Gráficos Associados, sendo que o “objecto” em que a nova edição está a ser
transformado é visto como “um memorial” ao trabalho e à resistência desses
mineiros do Pejão que perderam esse seu ganha-pão no ano de 1994, com o fecho
definitivo das minas, mas Adriano Miranda faz questão de
sublinhar que, “ O livro é preto, mas não é a cor do luto, é a
cor da mina – é a cor de uma homenagem “.
Por outro lado, à margem da apresentação do livro “Carvão
de Aço” em Castelo de Paiva, decorreu no mesmo local, uma exposição
fotográfica, com uma selecção de 20 imagens a preto e branco, de Adriano
Miranda, que vai circular pelo país, em zonas com historial mineiro,
através da iniciativa dos Roteiros de Minas.
Recorde-se a propósito que, no ano de 1994, quando Cavaco
Silva era primeiro-ministro, deu-se a chamada "revolta dos
mineiros das Minas do Pejão", onde cerca de 500 trabalhadores
ficaram no desemprego, depois do encerramento das minas, por orientação da Comunidade
Europeia.
Carlos Oliveira
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